Capítulo 10

Demi se arrependeu de não ter levado suas roupas de homem quando viu o imenso portão. Teria que pular o muro de vestido rodado. Não conseguia ver o interior da fazenda, e isso a deixava incomodada.
Subiu em um tronco e sorriu ao não ver nenhum capataz.
  — Tu não és muito precavido, Joseph Jonas...
Murmurou consigo mesma e jogou a bolsa com ferramentas dentro da fazenda. Tomou coragem e tentou, com todo cuidado, descer sem se machucar. Mas foi impossível, pois o enorme muro continha galhos com espinhos. Gemeu de dor ao ver que havia cortado o vestido, a perna e o braço.
  — Maldição — praguejou e ignorou a ardência, pegando a bolsa. Atrás de um arbusto, analisou os ferimentos. Rasgou um pedaço do seu vestido para limpar o sangue que escorria e aproveitou para prestar atenção na fazenda. A casa grande era muito bonita, como um castelo medieval, coberta de pedras. Localizou o estábulo e alguns casebres de madeiras, quais deduziu serem o que queria: lugar que os escravos estavam sendo mantidos e as mercadorias ilegais.
Ela cruzou o jardim como uma flecha, parando na porta do primeiro casebre. Não ouviu barulho algum e resolveu abrir.
Estava seguindo o conselho do Caveleiro em soltar os escravos por último. Doeu ao lembrar dele. Por que ele não estava ali agora fazendo aquilo? Não a amava o suficiente? Sentiu uma lágrima desobediente descer e enxugou, concentrando-se no cadeado.
Quando conseguiu abrir, acendeu um lampião para conferir o que tinha ali dentro e ficou frustrada. Ração para os animais.
E foi assim no segundo, terceiro e quarto casebre. No quinto, era uma casa mesmo. Conferiu com cuidado e percebeu estar vazia. Foi a mesma coisa com o sexto casebre. Sendo que nesse, ela sentiu o cheiro de vela recém apagada. Virou-se para sair e levou um susto.
  — Posso ajudar? — o homem perguntou, medindo a mulher de cima a baixo. Ela não respondeu, acertando um soco nele e saindo correndo. O lampião foi parar no chão quando ela deu de cara com mais um homem.
  — Eu só...
  — Não precisa se explicar pra nós, faça isso pro chefe.
  — Não, não! Solte-me! — ela gritou, debatendo-se, enquanto o homem a puxava pelo braço até a casa grande.
  — Fique quieta, moça. Não quero machucar ocê.
Arrastou a mulher até a casa e Demetria se perdeu quando entrou na sala. Tudo era incrivelmente bonito e elegante. Ela tentou se soltar mais uma vez, sem sucesso. Um dos homens a soltou e andou até uma porta. Ele bateu e abriu.
  — Licença, patrão. Achamos uma pessoa fuxicando os casebres e truxemos pro senhor ver — disse e logo acenou para que o outro trouxesse a mulher. Demetria quis sumir quando o empregado entrou com ela no escritório. Joseph se levantou, olhando a mulher, surpreso.
  — Demetria? — ele perguntou confuso, e a morena se sentiu humilhada. Como explicaria o que tinha ido fazer? — Saulo, Peter, podem ir, obrigado.
Os dois pediram licença e se retiraram. A morena observou a porta fechando, porque não queria encarar o homem.
  — O que houve contigo?
  — Digamos que seus muros têm espinhos...
  — E por que essa entrada triunfante? Se soubesse que virias me visitar, eu mesmo teria aberto os portões.
  — Não era uma visita — ela respondeu, dando um sorriso forçado. — Agora, com licença, preciso ir.
Ele se pôs na frente dela, impedindo que Demetria saísse. A mulher bufou, o encarando.
  — O que viestes fazer aqui?
  — Queres mesmo saber?! Vim achar uma forma de acabar com esse maldito casamento — confessou brava. Não tinha mais nada a perder, sua última esperança escorreu pelos seus dedos como água. — Não consigo suportar a ideia de me casar com um homem que detesto e com ideais que abomino. Não consigo me imaginar convivendo contigo!
  — Que ideais?
  — Tu és mesquinho, escravocrata, tolo, corrupto e opressor, como todos os outros fazendeiros dessa cidade. Só pensa no lucro, e não mede esforços para conseguir o que quer. A prova disso foi a minha mão.
  — Tu não me conheces mesmo...
  — E nem pretendo, pois o pouco que conheço já me enoja. Eu só quero saber por que eu? — ela perguntou perturbada. Gesticulava bastante, estressada com toda aquela situação. Seu emocional estava um lixo diante dos acontecimentos. — Por que eu?! Com tantas mulheres por essa cidade que fariam de tudo por ti... Por que logo eu?
Ela esperou uma resposta. Joseph sentiu uma culpa imensa ao vê-la naquele estado. Suja, descabelada, infeliz, esgotada. Queria abraça-lá e dizer que tudo ficaria bem, sentir seu coração acalmando junto ao seu peito. Mas droga! Não podia! Havia estragado tudo fingindo ser quem não era.
  — Perdão — ele pediu, organizando seus pensamentos. Tinha muito a dizer, mas nada conseguia falar. Ela suspirou, confirmando o que achava: ele tinha a escolhido por escolher. Tudo porque o detestava, e ele queria mostrar para ela que podia. Mas não era verdade.
  — Tu és repugnante mesmo...
A morena revirou os olhos, passando por ele. Parou com a mão na maçaneta quando ouviu a voz dele.
  — Quantas mulheres abolicionistas existem nessa cidade?
Ela não respondeu. Virou-se, mas ele estava de costas para ela.
  — Quantas mulheres que entendem política, negócios, são corajosas, recusam-se a serem submissas e detestam sua atual condição existem nessa cidade? — ele perguntou e a morena não entendeu o que ele queria com isso. — Responda-me, Demetria.
  — Aonde pretendes chegar?
  — Em você — ele respondeu e finalmente a encarou. Demi prestou bem atenção. — Fiquei fascinado ao encontrar uma mulher que partilhava dos mesmo ideais que eu, aparentemente.
  — Tu estás louco?
  — Eu não sou corrupto e muito menos escravocrata — ele revirou os olhos, andando até sua mesa. Ela não acreditou. —Não sou nada do que julgaste. Diga-me, encontrou algum escravo ou mercadorias ilegais em minha fazenda?
  — Não, mas tu tens outras fazendas...
  — Tu nunca acreditas em mim — ele deu um risinho, balançando a cabeça. — Achas que eu não percebi que estava tentando fazer como o Cavaleiro da escuridão? Acabar com minha fazenda?
  — Cavaleiro da escuridão? Uma lenda — ela respondeu indiferente, e Joseph se entristeceu.
  — Nós sabemos que não é uma lenda.
  — Nós? — ela perguntou interessada. Como ele podia afirmar com toda certeza? Joseph empacou e se xingou mentalmente por isso. Sua garganta estava coçando para dizer a verdade, mas todo seu corpo alertava para que não fizesse.
  — Já estive com ele.
  — E aonde eu entro nisso?
  — Na invasão à fazenda de seu pai — ele respondeu, desencostando da mesa e andando pelo cômodo. Demetria o olhou intrigada. Detestava quando Joseph fazia isso. — Tu deves ter visto com os próprios olhos o Cavaleiro em ação.
  — Eu estava dormindo quando fui acordada pela minha irmã e vi o caos que se encontrava a fazenda.
  — E isso basta para que ele não seja uma lenda. Quem mais destruiria várias fazendas sem um motivo aparente?
  — O que tu estás tentando fazer? — ela perguntou, já irritada com aquele assunto.
  — Responder por que te escolhi, mas tu não acreditas em nada do que falo. Diga-me, o que devo fazer?
Ela o encarou, agora sim entendendo aonde ele queria chegar com as perguntas. Ele a escolheu por se diferente das demais, corajosa e inteligente. A morena jamais havia pensado sequer nisso. Como um homem como ele podia a admirar? Era contraditório demais. Mas se Joseph estivesse falando mesmo a verdade? E se não fosse nada daquilo que ela julgou? Não, não era possível. Ou era?
  — Os fazendeiros da região não aceitariam que tu fizeste parte da reunião se não compartilhasse dos mesmos valores.
  — Se eles soubessem, não permitiriam —respondeu. Ela o encarou, ponderando se acreditava ou não. Não queria aceitar que estava mesmo errada. Mas Demetria lembrou de algo que a fez abandonar qualquer dúvida. O Cavaleiro havia dito que não poderia fazer nada e que em breve ela entenderia. O homem só atacava fazendas de corruptos, e por isso não podia invadir a de Joseph.
  — Oh, céus — ela murmurou, enquanto Joseph a observava, perdida, confirmando que homem a sua frente dizia mesmo a verdade. — Por que então fingiste ser um fazendeiro repugnante?
  — Porque não era seguro dizer logo que a conheci.
Ela o encarou, mas a ficha ainda não havia caído. Eram muitas surpresas em tão pouco tempo.
  — Eu... preciso ir.
  — Demetria, case-se comigo — ele implorou, pegando na mão dela. Temia que a morena realmente fugisse para se livrar do casamento. — Prometo que te darei uma vida diferente das demais esposas de Aruaz e como tu mereces.
Ela retirou sua mão da dele e se despediu com um "boa noite", antes de fechar a porta do escritório. Joseph suspirou, passando as mãos pelo rosto. Demetria ajeitou os cabelos, enquanto olhava a escada majestosa no meio da sala, junto dos móveis.
  — Espere! — Joseph pediu, chegando a sala. Percebeu que Demetria bufou, antes de virar-se e resolveu não pertuba-la mais com o casamento. — Está tarde para que voltes sozinha.
  — Meu cocheiro está me esperando. Mais alguma coisa, senhor Jonas?
Ele percebeu que ela estava impaciente. Não tinha mais desculpas, e por isso, negou com a cabeça. Joseph tinha certeza que ela o odiava ainda mais.
  — Na verdade, sim. Esqueci de dizer como estás bela hoje.
Demetria pensou que ele estivesse zombando dela, mas quando percebeu o mesmo olhar que ele lançou no dia que dançaram juntos, ruborizou. Fechou a porta com força, e saiu da fazenda rapidamente.

                             

Hahah, eu sei que vocês pensaram que ela iria descobrir que Joseph é o Cavaleiro, mas não foi dessa vez. Ainda tem coisa pra rolar.
Mas então, será que no próximo capítulo a Demi aparece para casar ou não aparece?!
Perdão pela demora. Estou sem capítulos prontos. Mas creio que o próximo não vai demorar. ;)
Obrigada pelos comentários mesmo! Eles são muito motivadores! ♡♡♡
Um beijão!







Comentários

  1. Adorei os caps das suas fics. Estao maravilhosas. POST MAIS AMOR

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  2. Ah espero que agora que a Demi sabe quem o Joe realmente é, deixe de desistir do casamento.
    To muito ansiosa para o dia em que ela descobrir e o Joe e o Cavaleiro é a mesma pessoa.
    Posta logo!!
    To amando muito a Fic

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  3. Perfeita as duas fics posta

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  4. Amando suas histórias, posta logo e faz maratona

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